quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Consideracoes sobre um Grande Mestre

No que concerne a criador e suas criacoes, quando o tema e' Mr. Sam Maloof,  provavelmente o maior expoente da marcenaria no sec. XX, nunca escondi que sou fa de carteirinha.


Assim e' que tendo recebido o livro ahi da foto `a esquerda sobre seu mobiliario — The Furniture of Sam Maloof, Jeremy Adamson/Jonathan Pollock, 2001 Smithsonian American Art Museum — mergulhei em sua leitura com prazerosa fome, daquelas de ler devagarinho e depois por vias das duvidas reler as partes mais envolventes. Inclusive, ocupado com a leitura da obra, embevecido com os relatos da vida e da obra do mestre, acabei imesmo por me afastar das lides com madeira, abandonei temporariamente a oficina, hehe.

Recomendo vivamente a leitura do livro, tanto para quem ja tem alguma familiaridade com o grande marceneiro e sua obra, quanto para quem dele so ouviu vagas mencoes. O autor centra-se no que diz o titulo, e relata a evolucao do mobiliario de Maloof incluindo com alguma minucia sua insercao no panorama  dos movimentos das artes e oficios no sul da California. Mas, se do autor ficam evidentes seus solidos conhecimentos sociopoliticos, por outro lado devo dizer se pode facilmente concluir que de marcenaria mesmo, de lidar com as maos, o autor pouco entende. Vejam, por exemplo:

Ha mencao, em multiplos paragrafos ao longo do livro, do afamado grande dominio que Mr. Maloof tinha do uso da serra fita e sua abordagem unica de efetuar sem qualquer modelo cortes livres com a peca no ar cortando sinuosidades em angulos compostos. E famosamente ha o relato, conhecidissimo, de como conseguia cortar dois bracos, direito e esquerdo, para uma cadeira de forma tao exata que, ao final, a diferenca entre eles era menor de um milimetro — utilizando como instrumentos de medida nada mais que o indicador e o polegar.

`A primeira vista o feito parece realmente assombroso, inacreditavel pericia. Mas ahi ha de se lembrar a serra fita era uma constante nos trabalhos do velho mestre e, mesmo ja idoso, ele continuava como sempre foi um workaholic, trabalhava rotineiramente de 10 a 14 horas por dia, 5 dias por semana, produziu centenas, milhares de moveis. E nao se pode esquecer a memoria muscular existe, e e' extremamente precisa: qualquer um de nos, ao contar dinheiro, detecta quando ha duas notas aderidas, ou quando duas folhas de um livro ficam 'coladas', nao e' verdade? Quero dizer, o feito notavel, a sabedoria da ponta dos dedos, como sabe qualquer artifice enrijecido na lide nao era talento inato (que ele tinha, e muito) mas, sim, fruto do trabalho.

Mas nao quero dizer o livro e' frio, um relato puramente analista. Pelo contrario, ha incontaveis relatos de casos personalissimos, recheados de empatia. Pinco um, por aperitivo...

Relata o autor:

Em fevereiro de 1986 Maloof deu um workshop em uma loja de artigos de marcenaria em Atlanta, Georgia. Um dos participantes era Jack Warner, um jornalista local relativamente conhecido que relatou sua experiencia em uma serie de quatro artigos cativantes que, sindicalizados nacionalmente, ajudaram a ampliar a fama de Maloof entre os marceneiros amadores de costa a costa dA Matriz. Na arrancada, declarou:

"A maneira mais simples e atraente de identificar Sam Maloof e' chama-lo o mais conhecido, o mais bem sucedido marceneiro do mundo — o sonho de todo o marceneiro de garagem feito realidade... mas ele esta tao distante dos marceneiros de garagem como eu, quanto Rubens estava do pintor de paredes do bairro."

Ao final dos dois dias de workshop Maloof tinha montado e dado forma, grosseira, a uma das que chamava cadeiras ocasionais de espaldar alto (do modelo mostrado, acabado, ahi nas fotos) e, na saida da demonstracao, convidou todo mundo a sentar nela. "Momentos como esse podem ser muito embaracosos", escreveu White mais tarde.
"Todo mundo se amontoa na volta sorrindo bestamente para o cara sentado, que nao raro se sente obrigado a oferecer alguma opiniao perspicaz sobre a coisa. Eu fui acho que o ultimo a sentar nela; demandou uma certa coragem.
Os assentos das cadeiras de Maloof sao longos e generosos; uma crista saliente no centro desestimula ficar-se encarapitado na beira, incita a gente a deslizar pelo assento levemente inclinado ate a profundidade oca do fundo. Chegando la, tem-se a sensacao de estar em um berco. Relaxe, e os sarrafos verticais apoiam a base de sua coluna e o cume ampara sua cabeca. Os longos bracos suportam firmemente seus cotovelos e seus dedos se curvam sobre as formas sutis das pontas. Desconfio que cada um das tres duzias de homens e mulheres neste seminario sentiu que Maloof tinha feito a cadeira pensando nele. A cadeira ainda estava rugosa e peluda das grosas e da serra fita; nem uma parte havia sido lixada. Mas ainda era a cadeira vertical mais confortavel que eu jamais experimentara — de madeira ou estofada."

O relato, quando o li, me fez lembrar de quando fiz minha imitacao da famosa cadeira de espaldar baixo de Sam Maloof. A surpresa de ver o 'enorme' tamanho do assento quando montado, me levando correndo a ver se nao tinha errado as medidas. A inacreditavel comodidade da desconfiada primeira sentada...




Como?

Isso nao esta parecendo uma critica, sequer uma mera recomendacao, mas a opiniao de um fanatico?

Nao. Nao esta parecendo.

E'!


terça-feira, 27 de setembro de 2016

Armario de fim de inverno — na parede

O armarinho, uma vez seco o veneno, recebeu cera no compartimento inferior, escuro, e duas demaos de oleo de tungue nas demais areas. Exceto a parte posterior, contra a parede, que recebeu duas demaos de antimofo.

Para fechar o compartimento inferior construi uma porta com restos de pinho e compensado naval, fixei com dobradica piano e fiz fechos com imas. Tambem ganhou veneno, duas demaos de oleo de tungue no exterior, e cera no interior, escuro. Ahi, meia duzia de demaos de goma laca onde tinha sido aplicado o oleo e entao cera. E ficou pronta a encrenca...




Para colocar o movel em seu lugar, fixei em nivel a barra do encaixe frances com dois parafusos em buchas embutidas, depois de garantir os furos para as buchas nao iriam atingir nada importante soterrado na parede, e pendurei o armario.

Como esperado, as laterais com as tiras de compensado 'defeituosas' — o ponto forte do estilo rustico rude, parecendo pintura modernosa, na opiniao de um amigo — ficaram praticamente invisiveis com o movel no lugar. (O que, naturalmente, originou protestos de minha funcionaria que jura que gosta do jeito das laterais. Fazer o que? Alguem sempre reclama. Como outros reclamaram que, pelo ambiente, o movel TINHA de ser pintado de branco...)

Ficou como se ve nas imagens abaixo.

E, como diria meu amigo Durgue Costa, o Cigano:
Azar!... Eu gostei.





sábado, 24 de setembro de 2016

Armario de fim de inverno — a carcaca

(Clique nas imagens para ve-las em maior resolucao.)

Uma vez seca a colagem dos paineis laterais, por descargo de consciencia e porque imagino o movel va receber alguns consideraveis maus tratos no seu futuro dia a dia, optei por reforcar as emendas aplicando-lhes um longo parafuso desde a lateral. E entao cobrindo com um tampao de cedro rosa a cabeca dos parafusos, imitando uma cavilha, porque na minha estranha religiao moveis que usam parafusos estruturais nao podem mostrar tais parafusos, hehe.

Formando a caixa

O passo seguinte foi cortar de uma prancha de pinho (araucaria) a base e a prateleira central. A base foi fixada `as laterais com doze parafusos, seis em cada lado, e a prateleira foi encaixada em um sulco aberto com dado blade nas laterais e entao fixada com quatro parafusos de cada lado, dois em cada coluna. Nenhuma cola, e as cabecas dos parafusos foram igualmente cobertas com tampao de cedro rosa.



Baseado no principio (religioso?) de testar fazer o que dizem nao se faz, optei por deixar o 'lado ruim' das laterais, onde as pranchas estao repletas de 'defeitos', virado para fora e o 'lado bom', com as laminas de cedro gaucho praticamente intactas, para o interior do movel. A ideia fundamental, claro, sendo que ao inves de tentar esconder, disfarcar as inumeras imperfeicoes dos lenhos colhidos da 'sucata', e' bem mais honesto deixar essas imperfeicoes absolutamente expostas, no 'estilo' que resolvi chamar de rustico rude — e ver com que jeito a coisa vai ficar. (Enquanto, evidentemente, a preocupacao basica e' que o armarinho seja absolutamente resistente, duravel e, se necessario, passivel de ser consertado, retocado, arrumado, etc., se e quando porventura surja tal necessidade.)

Neste momento no entanto e' muito possivel, provavel mesmo, algum de meus sete fieis leitores, mais miudeiro, com toda a propriedade esteja indagando: "Mas o que uma prancha de pinho de 30cm de largura esta fazendo na sucata?" Assim, o': O proprietario da madeireira que mais frequento —sabendo bem que estou longe de ser perito, mas tambem nao sou um total idiota quanto a conhecer madeiras, e que por alguma razao eu procuro selecionar taboas com nos, grana revessa, desenhos e tal ao inves das taboas bem regulares que a maioria de seus clientes prefere — me ofereceu essa prancha por um preco especial, com consideravel desconto. Por que razao? Porque a prancha inclui a medula, o que os Grandes Irmaos chamam pith, o centro de crescimento da tora; e nao apenas madeira com medula tende a trabalhar, empenar de tudo quanto e' jeito, como a medula e' um lenho esponjoso, fragil, e extremamente vulneravel a organismos xilofagos.

No centro da taboa, a medula

No entanto, apesar desses, mm, inconvenientes, a zona da medula apresenta usualmente uns desenhos e coloracoes interessantes e, sim, sob certas condicoes pode-se contornar seus piores problemas. Por isso — e pelo preco, claro — fiquei com a taboa, mas a deixei meio separada, na porta da sucata, digamos assim.

Os pedacos que cortei para fazer a base e a prateleira, como se ve nas imagens abaixo e como era de se esperar, apresentaram seus problemas. A parte que virou a prateleira (`a esquerda) apresentava uma boa area atacada por broca, o que resolvi com a medida geral de aplicar Jimo® Cupim em todo o movel e, no especifico, por entupir os furos com massa de serragem de pinho e cola. A parte que foi para a base (na direita), alem de uma certa descoloracao com fungos escuros, tinha alguma separacao em um veio (o mais escuro e avermelhado, no centro) e um par de rachaduras, o que tratei com cianoacrilato.




Ja as colunas dos paineis laterais, foram cortadas de um resto de louro freijo com defeitos: casca, brancal, manchas e algumas rachaduras nas extremidades. As rachaduras, como se ve na imagem `a direita, tambem foram tratadas com cianoacrilato; os demais defeitos... fazem parte do estilo rustico rude, hehe.



O proximo passo foi colocar o fundo.

Primeiramente coloquei na parte superior o conjunto para um encaixe em faca (ou encaixe frances), serrado de uma ripinha de freijo. Como no entanto o parafusamento necessitou ser feito muito na borda da coluna do painel lateral, resolvi reforcar colocando por cima, parafusado no topo das colunas, uma ripa de pinho. Colhida, claro, na sucata onde estava pelas razoes que me parecem obvias na imagem da direita.


O fundo propriamente foi feito com outro resto do compensado de cedro gaucho, umas taboas de louro freijo da 'sucata' (por curtas, manchadas e com brancal) e um resto de compensado naval todo manchado de fungos pretos. As pecas foram todas fixadas com parafusos; como na parte de tras do movel, contra a parede, os parafusos nao ficarao visiveis, nao foi preciso oculta-los (o estilo rustico rude e' rigido, mas condescendente, hehe). Aquela ripinha la em baixo, obviamente da sucata, serve para manter o armario no prumo quando for para a parede.



Um ultimo toque foi colar umas laminas finas de cedro rosa para cobrir os topos das laterais no alto do movel. Sim, vejam voces, o estilo rustico rude ate pode ser considerado feio. Mas nao pode ser guenzo, nao pode ser fragil e, principalmente, nao pode ser desleixado, oras...

Ahi, mais umas aplicacoes com as lixadeiras onde considerado necessario, sopracao e aplicacao de veneno, marron escuro no compartimento inferior, incolor no resto tudo.




E com isso, acho, a carcaca esta completada...


terça-feira, 20 de setembro de 2016

Armario de fim de inverno

Com um dos invernos mais complicados, mais chatos que o velho Pedro conseguiu aviar chegando (aparentemente; nunca se sabe...) ao fim, hora de tirar o po das maquinas. Ou, melhor, hora de fazer po com as maquinas, hehe...

Para retomar a embocadura, optei por executar um projetozinho simples para minha, mm, lavanderia: um armario onde armazenar sabao, amaciante, essas coisas, de forma a poder acessa-las sem precisar me abaixar (ja que atualmente eles ficam 'armazenados' no piso).



Adicionalmente, resolvi fazer o tal armario utilizando apenas 'sucata' — restos de (boas) madeiras que estao acumulados pelos cantos. Mais especificamente, resolvi utilizar tanto quanto possivel umas sobras da mesa que desmontei, um produto um dia relativamente comum mas hoje absoluta raridade: compensado de cedro gaucho. Um exemplar tipico, recem saido da 'sucata' esta mostrado ahi na foto `a esquerda (como sempre, clique nas imagens para ve-las em maior resolucao).

Passei algum tempo 'admirando' as pecas do raro compensado, imaginando de que forma poderia integra-lo na idea de movel que estava contemplando. Sim, como nao e' raro, do projeto so tenho a ideia, nenhum plano tracado, esperando que as madeiras me contem de que jeito a coisa vai ser, hehehe — um metodo que aprecio bastante mas que, inegavelmente, consome um bom tempo para desenvolver-se...


Ao final de algum tempo matutando, decidi por fazer uns paineis com o compensado, para serem usados como laterais do tal armario. Catei duas taboinhas de freijo e cortei delas quatro ripas para os lados longos e, de um retalho de cedro rosa, cortei quatro outras ripas para os lados curtos. O passo seguinte foi aparelhar devidamente as ripas nas plainas e, uma vez dimensionadas, abri um rasgo com a dado blade em todas elas. Isso feito, cortei as linguas nas extremidades dos lados curtos e... estavam prontas as molduras para o painel.

As ripas cortadas, aparelhadas e oom o rasgo aberto

As molduras, em montagem seca








O passo seguinte foi tratar o compensado de cedro: remover os pregos, dimensionar as pecas na serra de esquadria, dar uma ajeitada no aspecto geral da coisa, um trabalho para plainas e lixadeiras ate ficar algo minimamente apresentavel. Ajustar a espessura para entrar com leve folga nos rasgos da moldura, enfiar as pecas nos 'trilhos' e verificar as montagens secas dos paineis.

O lado 'bom' da montagem seca

O lado 'ruim' da montagem seca
As tiras de compensado estavam originalmente coladas e pregadas e, ao serem removidas, evidente que a parte colada sofreu um certo, mm, esfacelamento. Aplicado o pseudoacabamento com lixadeiras, um lado ficou relativamente apresentavel — o lado bom — enquanto que o lado esfacelado, o ruim, ficou parecendo uma colcha de retalhos.

Confirmado com a montagem seca o dimensionamento correto das pecas, foi feita a colagem da moldura com as pecas do painel apenas encaixadas, sem cola.



Observando os paineis prontos nos grampos, enquanto ficava pensando em possiveis retoques, confesso que ainda nao decidi qual lado dos paineis sera o interno e qual o externo, o bom ou o ruim.

Quando tirar os grampos vou ter que dar uma molhada neles para ver com que cara vao ficar antes de decidir. Mas, por hoje, e' por aqui que ficamos...


domingo, 28 de agosto de 2016

O seculo de ouro da marcenaria

Uma conversa com um amigo, iniciada no batido topico de discussao entre vantagens e desvantagens do uso de implementos eletricos na pratica da marcenaria, nao surpreendentemente derivou para a tambem batida afirmacao o seculo XVIII foi o apice, o ponto mais alto da marcenaria na historia, nada tao bom foi feito em mobiliario antes ou depois dos 1700s...


Nao se discuta, os moveis de topo do sec. XVIII — com suas madeiras selecionadissimas de essencias pincadas a dedo, designs rebuscados, entalhados e esculpidos, cravejados de marquetarias e laminacoes e coroados por ferragens riquissimas, estofados com tecidos requintadissimos — sao resultado de uma mao de obra ultra especializada aplicada com esmero irretocavel.
Mas, apontei ao meu amigo como aponto agora a meus sete fieis leitores, para inicio de conversa esses moveis ultra requintados nao eram encarados como meramente moveis, mas como obras de arte que sao. Seus autores nao eram vistos como artifices, mas como artistas, comissionados pela nobreza, pela Corte, pela realeza — tempo e dinheiro fartos, coisas secundarias na contratacao e na producao dos mesmos. E entao, para continuar a conversa e para total — ah, nao! — incredulidade de meu amigo, apontei que moveis da mesma estirpe sao construidos hoje em dia, em uma fracao do tempo e por uma fracao do custo.

Os protestos, como e' facil imaginar, foram inumeros e intensos. E, como tambem esperado, nenhum argumento foi, como jamais podera ser totalmente conclusivo.

De qualquer maneira devo dizer ficou evidente, mesmo meu amigo nao querendo de jeito nenhum dar o braco a torcer, o prato que lhe ofereci foi bem indigesto: espiar um catalogo relativamente atual de uma firma especializada em moveis de luxo:

https://www.centuryfurniture.com/Catalogs/catalog-brochures/Monarch.pdf

Sao 132 paginas e tem coisas assim, por la:


A conversa, claro, continuou. E eventualmente voltamos ao tema: usar ou deixar de usar ferramentas eletricas, hehehe.

Assunto, quem sabe?, para uma bathora dessas...


quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Chorando a resina derramada





Algumas madeiras oleosas tem a propriedade de, mais acentuadamente quando verdes mas frequentemente tambem depois de secas, extravasar resinas em sua superficie, espontaneamente ou induzidas por causas externas, como por exemplo variacoes de temperatura.



Embora esses extravasamentos em tese possam ocorrer em qualquer area na superficie do lenho de essencias propensas ao fenomeno, costumam ser muito mais frequentes e mais pronunciados nas areas onde ocorram nos.





Embora em madeiras aparelhadas a aplicacao de acabamentos como lacas, tintas, vernizes, etc., possa reduzir marcadamente ou mesmo evitar totalmente um extravasamento ao ponto de ocasionar escorrimentos como nas duas fotos acima, nao e' incomum que um derrame de resina, mesmo ocorrendo sob a pelicula de um acabamento, acabe por produzir alteracoes, descolorimentos, manchas capazes de afetar negativamente o aspecto do acabamento...



Ha relatos de diversas maneiras de tentar-se manter a resina aprisionada no interior das madeiras para evitar possa 'contagiar' os acabamentos, incluindo aplicacao de massas, resinas sinteticas, primers, selantes, etc. Embora varios desses produtos sejam capazes de efetivamente lacrar a superficie das madeiras impedindo, tanto a saida de resinas, quanto a absorcao de qualquer contaminante pelos lenhos, em sua imensa maioria eles sao opacos, ou seja, tornam praticamente mandatorio o acabamento final com tinta.



Particularmente, eu nao gosto de madeira pintada. Para o meu gosto, qualquer madeira oferece naturalmente uma superficie muito mais rica, incomparavelmente mais atraente e agradavel aos olhos do que a mais refinada pintura jamais sera capaz.

E embora eu frequentemente tenha utilizado essencias sabidamente notaveis por nao raro produzirem derramamento de resina — como pinus, eucalipto, pinho, cedros, etc. — e tenha sempre lhes aplicado acabamentos translucidos, nunca tive problemas como manchas, descascamentos, descolorimentos. Nada. Isso porque incluo praticamente sempre nos diferentes acabamentos que emprego um passo crucial; a aplicacao de no minimo duas mas usualmente varias demaos de um selador eficientissimo e quase transparente: a goma laca.



Afora todas as suas outras incontaveis qualidades, a capacidade dessa substancia empregada ha milenios no trato e conservacao das madeiras de, alem de fixar-se com rara tenacidade `as fibras dos lenhos, ser repelente aos oleos a torna, entre outras coisas, um selador perfeito. E nao sou so eu que digo: a literatura e inumeros relatos Rede afora me apoiam e ecoam.

E ja que estou dizendo, digo mais: Tanto quanto eu vejo, todos os outros acabamentos podem faltar no arsenal de quem lide com madeira. Essenciais, absolutamente indispensaveis, so dois: goma laca e uma boa cera.

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Cera microcristalina - conclusoes (quase) finais




Apos pouco mais de um mes de testes, acredito a microcera — mistura a quente de tres partes de parafina microcristalina e uma parte de cera de carnauba mais uma pitada de bicarbonato, tudo dissolvido em limoleno — definitivamente oferece protecao efetiva na protecao de tampos metalicos ou quaisquer metais ferrosos expostos.

Exceto por tintas, a cera demonstrou-se equivalente ou superior a todos os demais metodos de protecao de superficies metalicas que empreguei, e ainda incorporando varias vantagens adicionais como apontado nas postagens anteriores, salientemente baixos custos, financeiros e operacionais. E, de quebra, serve ainda como um bom acabamento para madeiras, hehehe...


O unico ponto onde a microcera mostrou alguma insuficiencia na protecao que oferece foi em circunstancias onde substancias capazes de provocar e/ou acelerar a oxidacao — como acidos, sais, etc., contidos por exemplo em suor, fezes de passaros, etc. — permanecessem prolongadamente em contato.


Apos mais alguns testes, o metodo que encontrei capaz de resolver essa limitacao foi aplicar, cumprindo rigorosamente todas as instrucoes de aplicacao, um fosfatizante comercial na superficie antes da aplicacao da microcera.

A imagem acima ilustra o efeito de deixar-se uma pequena poca de salmoura (feita com sal de cozinha) secar e permanecer sobre aco protegido por fosfatizante e microcera, durante ~22 horas.
Da esquerda para a direita, nas tomadas superiores, a salmoura secando ate formar uma pelicula de cristais. Nas inferiores, o sal iodado absorveu umidade do ar e manchou o metal; o resultado de limpar a superficie com um pano e entao o resultado de limpar a superficie com bombril.


A aplicacao correta de fosfatizante demanda sim um pouco de tempo para completarem-se devidamente as reacoes quimicas envolvidas no processo, mas nao e' trabalhosa, o produto nao e' caro e a protecao adicional que se alcanca e', nos casos onde se faz necessaria, bem efetiva.


Desnecessario dizer, mas digo de qualquer jeito, a microcera esta em uso corrente na protecao de minhas maquinas e ferramentas e, claro, as observacoes continuarao em busca de detetar eventuais falhas que possam vir a ocorrer em sua efetividade.

Se/quando for o caso, por certo virei informar.


quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Cera microcristalina - protecao de metais

(clique nas imagens para ve-las em maior resolucao)


A principal razao que me levou a testar a microcera (mistura 3:1 de parafina microcristalina com cera de carnauba) foi, como ja mencionei, verificar seu desempenho quando aplicada como antioxidante em superficies metalicas. Isso, como tambem mencionado, inspirado nos resultados obtidos empregando a Renaissance Wax (RW) que proporciona excelentes resultados — mas e' importada e portanto cara.

Mais uma vez me repetindo, nao pretendo aborrecer ninguem com relatos minuciosos dos como e dos por que. Resumindo, o que fiz foi aplicar a microcera como protecao em tampos de maquinas feitos em ferro fundido cinzento e em ferramentas que tendem a facilmente oxidar (formoes e plainas manuais), submete-las a testes simulando condicoes de trabalho com variada severidade em induzir oxidacao, e tirar uma temperatura: Se vale a pena o seu uso, e entao como usar.

Evidentemente, resultados mais confiaveis poderiam ser obtidos com maior tempo de observacao e maior variedade de testes mas, meu criterio, o que pude ver nessa semana de testes e' suficiente para conclusoes satisfatorias. Indiscutivelmente, outras maos, outros lugares, outros metodos levarao a resultados diversos do que obtive mas, espero, no fundamental as conclusoes serao as mesmas...

Logo apos a aplicacao da microcera
Nove dias depois, tudo igual fora a luz

Na protecao de tampos de ferro fundido foi onde a microcera apresentou seu melhor desempenho.

Na minha 'oficina' exposta ao elemento, ao ar livre para todos os efeitos praticos, o tampo de minha lixadeira oscilante de rolo ficou totalmente exposto durante nove dias. Farta variacao de temperatura (5 a 29ºC), umidade raramente inferior a 90%, nao raro 100%; choveu em oito dos nove dias. A oxidacao foi ainda 'facilitada' por adicionar poeira de madeira sobre o tampo por varios dias.

Ao final dos nove dias, nenhuma diferenca, a protecao foi totalmente eficiente.

O tampo da minha serra de bancada nao e' mantido impecavel. Longe disso. Marcas, ocasionadas por inumeras razoes durantes os varios anos que esta em uso, causaram manchas e oxidacoes que so foram removidas parcialmente. A microcera foi aplicada apos uma limpeza um pouco mais profunda, incluindo mesmo aplicacao de lixas em alguns pontos.

O que eu considero um tampo de serra limpo
O tampo recebeu, a diferentes tempos, diferentes 'facilitadores' de oxidacao buscando simular, mm, "coisas que acontecem". Joguei e sequei/limpei quase em seguida, agua quente e fria, alcool, goma laca, oleo, cola pva. Molhei as maos com salmoura para simular suor e toquei aqui e ali e sequei sem lavar, quase em seguida. Todos os dias, varias vezes, alem de serrar umas madeiras simulei serrar muitas outras, passando incontaveis vezes pra la e pra ca uma ripa de cedro gaucho.

O mesmo processo de testes, com intensidade algo menor, foi aplicado tambem `as mesas da minha desempenadeira. A cera resistiu a praticamente tudo, ajudando bem a lubrificar a passagem das madeiras. So nao resistiu `a salmoura: as marcas dos dedos enferrujaram. Foram removidas, umas com bombril, outras com lixa, e voltei a reaplicar a microcera. E voltei a sujar com salmoura. E voltou a enferrujar.

Suor — como se eu ja nao soubesse! — e' um problema serio....


O tampo da serra, `a esquerda logo apos a aplicacao da microcera, `a direita ao serem dados por encerrados os testes.

As manchas de ferrugem causadas pela salmoura ja tinham sido removidas.









As mesas da desempenadeira sofreram o mesmo, se menos intenso, regime de testes. Acima, `a direita, logo apos a aplicacao da microcera; `a esquerda, ao final dos testes.



Aplicada com bombril em uma demao cuidadosa, longa e repetidamente espalhada, e polida com bombril entre 15 a 45 minutos apos a aplicacao, a microcera demonstrou oferece uma protecao relativamente eficaz `a oxidacao, que permanece mesmo com uso relativamente intensivo das maquinas. No caso de surgirem pontos de oxidacao, como os causados pelo 'suor', e' limpar e reaplicar localmente.



Imagino em ambientes mais protegidos e com condicoes climatologicas mais amenas do que na minha 'oficina' aberta aos ventos, sera perfeitamente viavel uma reaplicacao geral da cera nao mais do que semestralmente, quica anualmente...
- ooOoo -


A protecao contra oxidacao nas ferramentas manuais, como e' facil de entender, deixou a desejar: as maos suam. E na lida frequentemente suam muito.














Como pode ser visto neste velho formao 'baleado' que foi empregado nos testes, o suor e' mesmo um problema serio.

A base do formao, antes de receber a microcera, foi lixada da ponta ate a linha verde, na imagem `a esquerda, ate ficar livre de qualquer oxidacao. Essa area foi tocada com os dedos umidos com salmoura e quase em seguida seca. No outro dia a ferrugem era nitida; foi removida com WD40 e bombril, e a cera reaplicada. Como apontam as setas amarelas, ficaram nitidas 'cicatrizes'.

O bizel foi polido no estropo antes de receber a cera, ficando espelhado. Tocado com salmoura e seco, resultado tal como na base.

Como contaminacao com suor e' algo praticamente inevitavel na superficie das ferramentas manuais, protecao apenas com microcera sera insuficiente.

A RW parece conseguir o feito de proteger contra suor, mas ainda preciso testar mais ate ter certeza e poder confiar.

Cera nas plainas tem a vantagem adicional de lubrificar as solas, e pode-se frequentemente utilizar os formoes sem lhes tocar as laminas — entao a microcera ate que pode ter seus usos. Mas para protecao contra o suor, pelo menos por enquanto vou continuar jogando pelo seguro e usando o paninho com oleo, que esse sim e' infalivel.

- ooOoo -

Essas sao minhas conclusoes finais.

Minha sugestao e': Discordem totalmente delas!

Considerem-nas integralmente equivocadas em premissa, metodos e analise, alem de pessimamente fundamentadas.

Comprem as ceras, preparem-nas e vao fazer seus proprios testes, chegar `as suas proprias conclusoes. E' barato, divertido e, coisa muito rara, tenho certeza. Certeza de que vai valer a pena.


terça-feira, 9 de agosto de 2016

Cera microcristalina - uso em madeira

Alem do uso como protetor para superficies metalicas com testes e observacoes ainda em curso, examinei tambem o emprego da cera microcristalina — que doravante vou chamar microcera — para acabamento em madeiras, na formulacao relatada nas postagens imediatamente anteriores a esta (3 partes de parafina microcristalina e 1 parte de cera de carnauba)...

O teste consistiu em, ao mesmo tempo em que as estava aplicando na barra de aco, aplica-las tambem em um pedaco que sobrara de um painel de cedro rosa e cedro gaucho; no segmento central de cedro rosa o produto importado, a Renaissance Wax (RW) e, em parte dos segmentos laterais de cedro gaucho, a microcera.

A imagem acima, tomada logo apos a aplicacao das ceras mostra bem as areas onde foi aplicada a microcera, pelo escurecimento provocado pelo solvente. Apos secar, tanto a microcera como a RW praticamente nao alteram em nada a coloracao das madeiras.

Note-se, tambem em madeira a aplicacao da RW e' muito mais simples: basta aplicar uma camada tao fina quanto possivel e, em seguida, remover o excesso com um pano limpo. A microcera necessita aguardar uns 15-20 minutos de secagem para remover o excesso, com pano ou, como foi o caso, com escova.


Como eu ja havia sido informado por minhas pesquisas sobre a RW, ela apresenta um serio inconveniente ao ser usada como acabamento em madeira, e que fica evidente na imagem `a esquerda (clique nas imagens para amplia-las):


A RW penetra bem e da bom preenchimento dos espacos dos veios mas, nas depressoes, permanece branca e opaca apos secar, com evidente prejuizo estetico do visual do lenho. Por isso, seu uso em moveis e demais objetos de madeira e' recomendado apenas em superficies ja acabadas, onde os veios ja estao preenchidos.




Ja a microcera, como mostra a imagem `a direita, apesar do 'inconveniente' da aplicacao um pouco mais trabalhosa e demorada, resulta totalmente translucida depois de seca, sem produzir quaisquer manchas.



Como mostram as imagens abaixo, ambas as ceras mostraram-se muito eficientes em impermeabilizar a madeira, com a microcera mostrando um acabamento nitidamente com maior brilho...
















Com essas observacoes, minha conclusao e', em funcao do custo e dos problemas com manchas esbranquicadas, o emprego de RW em madeira deve ser reservado para casos excepcionalissimos.

Ja a microcera parece-me ter bastante promessa e, independente de seu uso em metais, certamente pretendo inclui-la em meu arsenal de acabamentos.

Ate para testar a eficiencia do emprego da microcera como acabamento exclusivo, peguei um naco de cedro rosa na sucata geral e em um lado lixei sua extremidade ate G220. Entao, empregando uma formulacao de microcera com um pouco mais de solvente de forma a deixa-la mais pastosa do que a empregada nos metais, apliquei-a com pano na area lixada. Aguardei 15-20 minutos e removi o excesso com escova de sapatos. Uma hora depois aproximadamente, dei um polimento inicial com uma flanela e entao com um bone de la girado por uma furadeira manual a bateria...


Esse ai acima entao, o resultado de uma unica demao aplicada diretamente sobre a madeira lixada e crua. Alem do brilho acetinado, o que mais me impressionou foi a textura sedosa do acabamento.

As duas marcas circulares apontadas pela seta amarela resultaram de eu tentar, com forca suficiente para 'machucar' o lenho, usar as unhas  para remover e/ou arranhar o acabamento no dia seguinte `a aplicacao. Adesividade e resistencia muito boas, para o meu gosto.

Como disse, tem promessa...