segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Polidor — construcao e uso

Na postagem imediatamente anterior eu havia mencionado desejava aplicar no estojo para iPad um acabamento so com oleo e cera, e a intencao era usar uma politriz eletrica no final. Mas ahi veio a memoria de um instrumento que eu tinha visto usar na minha infancia: um polidor...



Tanto quanto pude averiguar, aparentemente e' uma das tantas coisas que vieram do Extremo Oriente e foram 'adotados' no Ocidente. Um entre varios exemplos orientais pode ser visto ja no inicio deste video coreano, no caso utilizado para nao apenas dar polimento `a madeira como para remover o que resultou carbonizado no processo:


Por ser varias vezes citado em L'Art du Menuisier — a biblia da marcenaria ocidental, publicado em 1769 por M. Andre Jacob Roubo — nos dias que correm o instrumento e' por varios autores modernos chamado polissoir e muitos pensam mesmo tratar-se de uma invencao francesa. Eu chamo de polidor, mesmo.

Mas como certamente um polidor nao e' algo que se encontre no comercio de pindorama (nA Matriz se acha sim, mas posto aqui acaba ficando ao redor de uns miseros quatrocentos reais), resolvi juntar o util ao agradavel e ao divertido e fazer um eu mesmo.

Comecei por comprar uma vassoura de palha no supermercado. Uma fortuna: treze reais.
 Ahi, tratei de desmontar a vassoura e 'capturar' a palha:

Primeiro passo: remover as 'costuras' de plastico

A seguir, cortar o arame

Removida a primeira camada, a 'saia' que fica por fora

Desdobrado o 'miolo' das palhas, a parte que da formato `a vassoura

Cortada fora a palha, em tres macos: a saia, o miolo e finalmente o centro


O miolo cortado foi para o lixo, o cabo guardei; e' certamente algo que eventualmente sera util. A seguir, peguei todas as palhas do centro e algumas do miolo, cortei ao meio e montei um feixe com uns 15cm de comprimento que, bem apertado, ficasse com uns 5cm de diametro.

As palhas cortadas ao meio



O feixe e' montado e bem espremido utilizando nos 'jiboia', ou constritores, com barbante

Como dar o no 'jiboia', ou constritor

O espaco entre os barbantes generosamente ensopado de cola branca
e deixa-se secar por uns minutos, para a cola penetrar
O barbante, sempre molhado em cola, e' bobinado bem apertado,
desde logo antes do primeiro ate depois do terceiro no
Deixado secar uns minutos, bobina-se no sentido contrario uma outra camada de barbante
cobrindo a primeira; o resto da palha foi guardado para possiveis futuros polidores, hehe

-- ooOoo--

Deixada a cola secar ao toque, as pontas do polidor
sao entao aparadas, com um estilete







A etapa seguinte apos aparar as pontas, consistiu em mergulhar ate saturar uma das pontas do polidor com cera de abelha liquefeita em banho-maria. Ha quem sature ambas as pontas, mas eu prefiro deixar uma seca mesmo.




A ponta saturada, removido o excesso de cera

A ponta 'seca'
A razao de manter uma ponta seca e' o polidor tambem apresenta muitos bons resultados mesmo aplicado seco, sem cera, direto na madeira. A palha comprimida nao e' dura para arranhar, mas e' suficientemente rigida para comprimir os veios superficiais, dando por assim dizer uma 'superaplainada' que deixa a superficie, mesmo crua, brilhante. Como talvez se possa ver nas imagens abaixo:




Um pedaco de imbuia (o recorte removido da camada do centro do estojo) usado para umas 'acertadas' nas minhas estrategias de aplainamento — como se pode ver pelos inumeros defeitos provocados.



A porcao direita da taboinha esta so aplainada, no centro foi polida com a ponta 'seca' do polidor e na esquerda com a ponta com cera. A imagem `a esquerda e' uma vista bem vertical, de topo; a da direita, com suficiente inclinacao para refletir um pouco o sol. (As diferencas entre os tres 'acabamentos' ficam mais evidentes se as imagens forem clicadas — o que como sempre as abre em maior resolucao.)

Como imagino se possa verificar, aplicar o polidor pelo lado 'seco' da quase tanto brilho quanto com o lado com cera, e com a caracteristica de nao mudar em nada a cor da madeira crua. (A parte com cera pode ficar ainda mais brilhante, dizem, aplicando outras camadas cada vez com mais pressao, e ao final polindo com politriz. Eu nunca testei.)

-- ooOoo --

Mas entao, pronto e funcional o polidor (e custando menos de R$ 20 no total), hora de aplica-lo no estojo de que tratamos na postagem anterior. Eis os resultados:





E para 2014 era isso. Ate o ano que vem, aproveitem bem as festas!


sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Nunca sai bem como planejado

(Como sempre, clique nas imagens para ve-las em maior resolucao.)


Aproveitando o inicio dos melhores meses do ano para se estar no portinho, enquanto me distraia dando uma arrumada nas tralhas na 'oficina' pensava em o que, exatamente, gostaria de fazer para exercitar tecnicas do que eu chamo "marcenaria de precisao" (em essencia, empregar ferramentas manuais para diminuir tanto quanto praticavel as margens de erro)...

Dai, encontro em uma das gavetas um envelope contendo um par de dobradicas barril (barrel hinges, em ingles)  — essas ahi acima, na imagem que abre essa postagem — e me lembro eu as havia adquirido ha quase uma decada, pensando em reproduzir um estojo para laptop que eu tinha visto no site de herr Rainer Spehl — esses ahi, nas imagens laterais — e que acabara nunca executando pela solida razao de nunca ter tido um laptop para chamar de meu. Ao ver as dobradicas no entanto, ocorreu-me que poderia fazer um estojo semelhante, nao para um laptop mas para alojar um i-Pad, um projeto em que poderia empregar as tais dobradicas e certamente uma oportunidade de treinar tecnicas manuais.


Ao inves de utilizar compensado, decidi fazer o estojo aproveitando um belo resto de imbuia. A ideia foi bem simples: em essencia, dimensionar grosseiramente a taboa de imbuia e entao desdobrar em tres fatias, tudo na serra de fita, projetando que a fatia "do meio" viesse a ter quando acabada a mesma espessura do tablet; cortar no centro nessa fatia um buraco quadrado com as dimensoes do i-Pad. E entao, colar o 'sanduiche' e abrir a 'tampa'.


E foi o que fiz. A parte de "marcenaria de precisao" ficou por conta de melhorar, acertar, afinar dimensoes, linhas, angulos, superficies, planos, justaposicoes, empregando plainas e formoes. Mas e' bom esclarecer: gosto de usar e, ainda mais, dos resultados que se obtem empregando ferramentas manuais. Mas nao sou fanatico; antes pelo contrario, tenho muita apreciacao por ferramentas eletricas. Nao so os cortes iniciais e o desdobro foram na serra fita, o aparelhamento inicial foi na desempenadeira, desengrosso e serra de bancada. As ferramentas manuais entram na hora de 'afinar' as coisas, e no acabamento.

Mas nao so na madeira acabei me afastando do modelo de herr Spehl. Para comeco de conversa acabei nao usando as dobradicas barril, por razoes ergonomicas: se o tablet fica suficientemente afundado no estojo para a tampa poder abrir utilizando as dobradicas barril, os dedos ficam sem pegada para puxa-lo; se suficientemente exposto para dar boa pegada, a tampa nao fecha.



Igualmente, fortes imas de terras raras a pequena distancia de um computador nao me parece boa ideia. Por isso, acabei colocando uma dobradica externa, em uma lateral, e um fecho na outra.


 Alem disso, o artista alemao em seu projeto forrou todo o interior do estojo com couro; eu optei por utilizar veludo azul, e apenas no lado do vidro do i-Pad, confiando a madeira estava suficientemente aplainada para nao oferecer riscos `a carcaca do computador.




Alias, afora o ajuste submilimetrico para praticamente todas as dimensoes, a participacao da "marcenaria de precisao" foi ainda mais saliente na plainagem das faces.

Continuando meu aprendizado da setagem de plainas, consegui — pela primeira vez, diga-se de passagem — superar o obstaculo que as tortuosidades dos veios da imbuia representam e obter uma superficie mais lisa do que se pode conseguir com lixa G600 (tudo bem, confesso: se repararem bem nas fotos com maior resolucao da para enxergar aqui e ali ha ainda uns arrepiozinhos, hehe). Mas de fato, como se pode ver na foto abaixo, as superficies resultaram tao lisas que ficaram um pouco espelhadas.



O acabamento que escolhi aplicar foi apenas oleo de tungue e cera. Ate aqui, apenas duas demaos do oleo foram aplicadas, seguindo o padrao: Com pano ensopado o oleo e' bem esparramado, deixado uns 15-30 minutos para a madeira absorver bem e entao todo o excesso removido com um pano seco e limpo. A ideia e' aplicar ainda mais um par de demaos de oleo antes de comecar com a cera, deixar tudo secar bem e entao polir com uma politriz eletrica. Para ver como vai ficar, hehehe.


Enquanto aguardamos como, um batdia desses, podera ficar o resultado final, deixo ahi abaixo um par de imagens de como o estojinho esta, hoje...




segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Por uma dessas coincidencias, outra vez meu dezembro fica mais alegre com formoes.

De brincadeira eu havia postado no forum Madeira! umas imagens de tres superformoes japoneses de parear e me posto `a disposicao de ganha-los caso alguem quisesse dar...


Pois olhem so o que um motoboy veio me entregar, faz pouco:


Dois belos formoes japoneses de parear (para usar so com a forca das maos, nunca para serem tocados com um malho). Ja devidamente afiados ate o polimento, cortam melhor do que navalhas.

Pelo angulo do bizel e pelo aco, durissimo, nao sao bem indicados para uso em nossos lenhos mais rijos. Mas imagino em cedro, louro, pinho, nessas madeiras mais macias vai dar para brincar bem. Fazer festa!



Pois entao, para quem estiver por ahi lendo essas malbatucadas, meus votos voces tambem facam festa. Boas, felizes festas!


segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

A andorinha cega


Pode-se dizer o uso de emendas com malhetes em cauda-de-andorinha, pelo reforco estrutural que fornecem ao encaixe (e uma muito maior area disponivel para cola, quando for o caso), e' um recurso empregado desde tempos imemoriais, por todas as culturas, para todos os materiais como madeiras, metais, pedras, etc.

Embora mais modernamente a estetica tenha preponderantemente dado preferencia a deixar evidente o trabalho do artesao, mantendo os encaixes `a vista — e os rabos-de-andorinha sejam frequentemente vistos como sinonimos de construcao bem-feita, capricho e cuidados —, como pode ser constatado facilmente observando-se originais, reproducoes ou imagens de moveis classicos, desde a antiguidade ate par de decadas atras a preferencia era por ocultar, ou no minimo disfarcar, as emendas.


Ate os mestres da marcenaria e da carpintaria japonesa, famosos por justamente procurar deixar o minimo de seu trabalho exposto, ocultando tao fundo as enormemente complicadas ensambladuras que executavam que nos tempos modernos e' necessario examina-las com raios-X para revelar como foram feitas, hoje ate mesmo esses mestres resolveram deixar a modestia de lado e expor salientemente sua tecnica em formas que nos deixam boquiabertos...


Mas... Pera ahi um pouquinho!
Sera que era mesmo por modestia que os antigos davam preferencia `as emendas cegas?


Essa minha duvida nasceu ao assistir um episodio de The Woodwright Shop, a serie mais antiga no ar da TV dA Matriz, capitaneada ha 33 anos ininterruptos por Roy Underhill. No final desse recente episodio da temporada 2014-2015 (o episodio denominado Campaign Furniture, acessivel desde http://www.pbs.org/woodwrightsshop/watch-on-line/2014-2015-episodes/), e' demonstrada por Christopher Schwarz uma tecnica de execucao de emenda cega com malhetes em rabo-de-andorinha.

Um reconhecidamente conhecedor profundo de tecnicas classicas de marcenaria, enquanto executa sua demonstracao em breves minutos Mr. Schwarz menciona de passagem que nessa tecnica os malhetes podem ser cortados sem necessitar o esmero habitual, porque no final tudo vai ficar mesmo escondido...

A-rra!
Bem ahi nasceu-me a duvida: os marceneiros de antanho preferiam mesmo executar emendas cegas para ocultar seu trabalho ou, ja que a coisa ia mesmo ficar escondida, era para poderem trabalhar mais rapidamente e com imensamente maior tolerancia a erros?

Nao achei nada que pudesse responder a essa pergunta de forma definitiva mas, de qualquer modo, ate para treinar o uso das ferramentas resolvi tentar executar uma emenda dessas; uma emenda em esquadria cega com malhetes em cauda-de-andorinha, como essa mostrada ahi `a esquerda.


Comecei por montar, na falta de melhor palavra, um "jig" — uma rampa a 45° para servir de apoio a um formao na hora de cortar as meia-esquadrias — a partir de um resto de cedro-rosa. (A unica parte da rampa realmente a exatos 45°, diga-se, e' o retangulo apontado pela seta verde ahi na foto `a direita; o resto tudo e' para dar volume, peso, apoio.)

A etapa seguinte, uma vez seca a colagem da rampa, foi marcar em uma ripa da 'sucata' a posicao dos malhetes, e corta-los. E foi cortar o primeiro, e reparei que a marcacao estava completamente invertida. (Algo que, pelo menos comigo, nao e' incomum acontecer: fico muito concentrado pensando em um aspecto da coisa e deixo o separador de orelhas no automatico, sem supervisao, para o resto — e ele nao raro erra o penico.) Constatado o erro, resolvi continuar do mesmo jeito, alegando para mim mesmo que o que interessava era testar o jig, nao fazer uma emenda perfeita, ate antes pelo contrario. (Desatento, distraido, trapaceiro e preguicoso, alguns de meus atributos menos cantados, hehe.)


Uma vez cortados, os rebaixos e os malhetes, hora de aplicar o formao com a ajuda da rampa para cortar as meia-esquadrias, o que acabou sendo mais facil do que eu esperava, mas mesmo assim sublinhou empregar esse metodo exige formoes muitissimo bem afiados...

Ahi — com a ajuda de alguns grampos, pois os encaixes com os malhetes invertidos por certo e por nada queriam saber de ficar montados, hehe — montei a emenda.


Como voces podem ver nas fotos abaixo, embora eu tenha feito a emenda pela primeira vez, sem o menor capricho, com os malhetes invertidos, uma lamentavel matacao mesmo vendo com a melhor das boas vontades... olhando a coisa montada ficou tudo perfeito.


Agora entao, decidam voces: os marceneiros d'antanho faziam essas emendas assim cegas por estetica, para nao evidenciar o trabalho, ou por que era o jeito mais facil mesmo?


sábado, 29 de novembro de 2014

Afiando formoes e plainas - VI (Como eu faco - 2)

Uma vez plana e polida a traseira da lamina, ou quando uma lamina afiada perde o fio, a atividade seguinte para amolar ou renovar o gume sera aplainar e polir o plano do bizel. Dependendo do estado da lamina, podera ser um processo algo demorado, ou um tapa.

Embora como ja disse eu estivesse plenamente satisfeito com a excelente qualidade do fio que conseguia obter em minhas plainas e formoes utilizando as pedras d'agua japonesas, permanecia o fato eu continuava muito insatisfeito com a afiacao que conseguia obter, utilizando motoesmeril, nos meus ferros de tornear. Eventualmente, consegui a colaboracao de um amigo que me trouxe desde o Velho Continente uma excelente maquina dedicada de afiacao: a Tormek T-7. Com a variedade de jigs que suporta, essa afiadora consegue afiar a lamina de praticamente qualquer ferramenta. Inclusive formoes e plainas.

Com a adicao da afiadora `as minhas pedras japonesas, a afiacao de meus formoes e plainas tornou-se ainda mais facil e precisa. Mas se dar a primeira amolada em uma lamina nova, ou usada em mau estado, havia-se tornado algo relativamente simples e com resultados previsiveis e excelentes, eu ainda permanecia adiando tanto quanto possivel re-afiar minhas laminas, preferindo utilizar um restinho de fio ainda aceitavel do que enfrentar o chatissimo e prolongado trabalho de 'montar o circo' da afiacao. Mergulhar as pedras; montar no lugar, ligar e fazer o setup basico da afiadora, preparar os jigs e entao seta-los para cada lamina, impermeabilizar o tampo da bancada, e tal e coisa, tudo isso consome muito, mas muito mais tempo do que o par de minutos que, uma vez armado o circo, a reafiacao propriamente consome — se e' que voces me entendem...

Entao — saltando os detalhes para resumir uma historia que ja vai ficando mais longa do que sesta de argentino — vim a ter contato com a tecnologia das pedras diamantadas, e com esse video do Paul Sellers:

Obviamente, minha insaciavel curiosidade acabou por me levar a adquirir quatro pedras diamantadas (grossa, media, fina e extrafina) e monta-las em uma pranchinha que pode ser rapida e facilmente levada `a area em que estiver trabalhando, dar umas borrifadas com limpa-vidro e... pronto!


Nao cheguei (ainda?) a dominar completamente a tecnica de amolar o bizel deixando o gume levemente abaulado mas atualmente so uso a guia de afiar em circunstancias especiais; no geral afio direto na mao. E a qualquer momento que acho o fio possa ficar melhor, e sempre que termino de utilizar um formao ou uma plaina, a prancha com as pedras diamantadas vai para cima da bancada e, tcha, tcha, tcha, meia duzia de passadas e a lamina corta ate pensamento, hehehe.


Embalado pelo sucesso do metodo, fiz um estropo com couro para sentar o fio com pasta verde, e consegui ainda tres 'pedras' de aco onde colocar pasta diamantada para o caso de afiacoes que realmente merecam aquele toque superextraespecial, tipo plainas de alisar — como pode ser visto na foto ahi acima: na frente as 'pedras' de aco com as seringas contendo a pasta diamantada sobre elas, da esquerda para a direita, 1, 3 e 6 microns; atras `a esquerda, a tampa que evita contaminacao das pedras com impurezas e, `a direita, o estropo com dois tijolos de pasta verde em cima.

Com isso passei a afiar meus ferros com muito maior frequencia, e nao apenas minhas ferramentas ficam permanentemente muito afiadas, meu treino aumentou consideravelmente, de tal forma que o processo ficou ainda mais facil e mais rapido. (E certamente mais preciso, me permitam a gabolice: eu ja me dei ao luxo de re-afiar uma lamina descartavel de bisturi cirurgico e, para o meu gosto, a coisa ficou cortando melhor do que quando nova, hehehe.)

Quanto a cuidados, a afiadora como toda maquina deve receber manutencao — e o fabricante aponta tudo o que deve ser feito, detalhadamente. As placas diamantadas, depois de usadas sao secas com papel toalha e antes de serem guardadas recebem uma borrifada de WD-40 para evitar a corrosao, e boa. O unico cuidado com as placas com pasta diamantada, afora guarda-las bem protegidas de poeira, e' limpar bem a lamina sendo afiada ao passar de uma pedra para a mais fina, para evitar contaminacao da pasta mais fina pela mais grossa.

Bom, e' assim que eu faco.
Como eu disse, cada um tem o seu jeito, e nao tenho a menor pretensao o meu seja melhor nem pior do que qualquer outro. O uso e os recursos disponiveis e' que irao em tempo, pelo treino, ditar qual a melhor e mais efetiva maneira sera a que corpo e habitos de cada afiador acabara adotando. Como tudo em hobby, o ceu e' o limite (sim, existem tecnicas de afiacao que utilizam lupas para mais perfeitamente poder aplicar fio, empregando laser como abrasivo; e, imagino, nem isso sera o teto, hehehe), mas cada um e' que ira determinar o quanto querera investir, ate onde querera chegar.

O importante, o fundamental, e' — do jeito que der, de qualquer jeito — ter os ferros bem afiados.

Nem que seja mandando afiar, hehehe...

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*Um dos tantos temas que nem sequer abordamos, mas e' crucial ao uso de ferramentas de fio como formoes e plainas, e' o angulo do bisel. Assunto demasiado amplo, e essa serie ja vai por demais extensa, talvez ja insuportavelmente chata.

Um outro capitulo, talvez, uma outra bathora?

Afiando formoes e plainas - V (Como eu faco - 1)

Acho que embora o proposito a atingir seja o mesmo — obter um fio agucado na ferramenta pelo cruzamento de dois planos lisos e polidos — pode-se dizer sem medo de errar que cada afiador tem um jeito seu, pessoal, de atingir esse objetivo. Mas quando alguem pensa em se iniciar nessas artes, qual a melhor maneira de comecar? Qualquer uma, seria a minha resposta. So que, convenhamos, isso nao responde nada. Entao, como eu acho que qualquer jeito e' um bom jeito de comecar resolvi, primeiro, apresentar um link para uma serie de videos (em portugues!) disponibilizados por Helio Cabral Jr. no YouTube, e que me foi gentilmente apontado por um colega do forum Madeira!, o FernandoBorges:

https://www.youtube.com/watch?v=dJfVo0Upy6U&list=UUiAkREnTDMdYQMqR6pcXQoA

Ha ahi bastante por onde comecar, penso eu. As tecnicas apresentadas nesses videos sao mais centradas em afiar facas e canivetes, sim, mas ha muita riqueza em dados e informacoes extremamente uteis, e e' facil extrapolar isso para formoes e plainas,


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Quanto a como eu faco, inicio por corrigir, se houver, problemas na formatacao da lamina — irregularidades, deformidades, etc., como dentes por exemplo — ou por mudar o angulo do bizel, arredondar os cantos, etc., se por qualquer motivo desejar alterar a formatacao.

Isso e' usualmente feito empregando um motoesmeril. Os cuidados aqui sao

  • cuidar que os rebolos estejam sempre planos e esquadrejados (retificados), para tanto utilizando quando necessario corrigir-lhes a geometria retificadores ou bastoes dressadores...
retificadores
bastoes dressadores
  • ... e evitar utilizar os rebolos cinzas que usualmente acompanham os motoesmeris, trocando-os por rebolos brancos. Isso porque os rebolos brancos produzem menor calor na area de abrasao evitando, ou ao menos reduzindo consideravelmente, os efeitos indesejaveis da temperatura aumentada sobre a tempera das laminas. 

O proximo passo, em se tratando de lamina nova ou sendo afiada por mim pela primeira vez, sera aplainar e polir a parte de tras da lamina. E' um processo que pode ser mais ou menos demorado conforme o estado em que se encontrar a lamina, mas tem a vantagem de so necessitar ser feito uma vez.


Quando comecei meu aprendizado de apurar a afiacao de meus formoes para alem do que eu alcancava apenas com rebolos, eu empregava uma dessas pedras comuns
Minha primeira pedra de afiar
de afiar facas que se encontra em supermercados, e seguia a recomedacao de aplainar a parte de tras da lamina em uma extensao de mais ou menos uns 5 centimetros. Uma vez tao bem aplainada e polida eu conseguia deixar a traseira da lamina, empregando a mesma pedra combinada (as granas sao aproximadamente G100 no lado grosso e G300 no fino) eu atacava o bisel do formao, retificando as irregularidades e regularizando o bizel tanto quanto possivel. O resultado era ate aceitavel, mas certamente ainda ficava longe do que eu via nos videos e do que lembrava dos formoes que tinha manipulado (mas nunca afiado) em minha infancia/adolescencia. Minhas pesquisas na Rede entao me levaram a conhecer o metodo das lixas, o tal de scary sharp tratado na primeira postagem desta serie, e ao emprego de guias de afiacao. A pratica desse metodo resultou consideravel salto na qualidade da afiacao que eu conseguia obter em meus formoes, ja bem perto, se nao no par do que via e lembrava.

Mas, como nao me cansa lembrar, muito antes que artifice eu so mesmo e' curioso. E as leituras na Teia haviam certamente espicacado minha curiosidade e o desejo de empregar as tais pedras de afiar japonesas, tao decantadas quanto dificeis de encontrar...

Como quem insiste e tem amigos sempre acaba alcancando o que quer, acabei conseguindo obter tres pedras d'agua duplas japonesas, marca King, granas 800/4000, 1000/6000 e 1200/8000. Uma maravilha! Nao apenas atingindo um espectro de granas muito alem do que conseguia dispor com as lixas d'agua, estava livre das constantes trocas de lixas rasgadas ou gastas, das dificuldades de prender as lixas no vidro, e tudo, e tal. Finalmente consegui alcancar o tal brilho espelhado nas superficies amoladas e um fio capaz de cortar folhas de papel ao comprido como se fossem manteiga!

Minhas pedras d'agua, guia e taboas de polir

Minhas leituras haviam ainda me informado sobre tecnicas de 'sentar o fio' utilizando laminas de madeiras bem planas recobertas com pastas de polir, coisa que logo tratei de implementar. E, nisso, havia conseguido finalmente alcancar um padrao de afiacao superior. Tao bom como podia almejar, superior a qualquer lembranca ou desejo que jamais pudesse ter tido, na verdade — se me permitem a imodestia — tao bom como jamais vi.

Na foto ahi `a esquerda ve-se, dentro da bandeja em que ficam totalmente submersas em agua quando em uso, as tres pedras japonesas; `a sua direita apontada pela seta verde minha guia de afiacao e mais atras, apontadas pelas setas vermelhas, `a esquerda a madeira recoberta com pasta Jacare verde e a direita, as tres taboinhas recobertas com pasta diamantada, de 6, 3 e 1 micron de granatura.

Essas pedras e taboas sao ainda hoje o conjunto que utilizo para aplainar e polir a traseira das laminas, novas ou usadas pela primeira vez por mim. Por desnecessario, nao estendo mais o polimento por ~5cm como costumava, mas me limito a deixar plana e espelhada uma area de uns 2-2,5 cm, passando a traseira das laminas ate obter um padrao homogeneo progressivamente por todas as granas das pedras e entao pela taboa com pasta verde (uma grana aproximada de G15000). (As taboinhas com pasta diamantada nunca uso na traseira de laminas.)  Esse aplainamento e polimento e' definitivo, praticamente nunca necessitara ser refeito quando se re-afiar as laminas.

Os cuidados aqui, cada vez que usada uma pedra ela deve ser retificada, ou usando outra pedra, ou uma lixa sobre vidro, ou como seja, mas manter a superficie de afiacao sempre absolutamente plana e' indispensavel para uma boa afiacao. As pedras d'agua devem seguir a recomendacao do fabricante no que tange `a sua conservacao. No caso dessas King, devem ser mantidas submersas por 15 minutos no minimo antes de serem usadas, mantidas submersas enquanto em uso, e guardadas secas quando fora de uso por tempo mais prolongado. As taboas, devem ser carregadas com pasta antes de cada uso e protegidas contra po e impurezas quando guardadas.

(Essa era para ser a ultima postagem nessa serie sobre afiacao, mas como podem ver a coisa ficou muito comprida, entao achei melhor dividir em capitulos. Ou seja, a historia ainda continua, hehehe...)